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Praia de
Ramos no início do século XX: construção da “Copacabana dos Subúrbios”
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A praia de Ramos faz parte da história do bairro de
Ramos e de sua população. Do começo aristocrático à deterioração ambiental,
decorrente da poluição por dejetos industriais e humanos, a localidade chegou
ao século XXI bastante modificada. No entanto, ainda se mantém como opção de
lazer para habitantes da região, do subúrbio da cidade ou da periferia, que
enfrentam dificuldades para acessar outras praias fluminenses.
Por volta de 1910, a Praia de Ramos começou a ser
conhecida como a “Copacabana dos Subúrbios”, numa alusão à famosa praia da Zona
Sul carioca. Famílias inteiras desciam a serra de Petrópolis para passar o dia
em Ramos, inclusive por indicação médica, pois suas areias eram consideradas
monazíticas.
Ponto de
encontro – Para a
vizinhança ou moradores dos arredores, Ramos era ponto de encontro, de práticas
desportivas e do imprescindível contato com o mar, tão ao gosto do carioca – mesmo
sendo um “mar de baía”. Assim como ocorre hoje nas praias da zona sul do Rio,
em Ramos havia redes para jogos de basquete e vôlei, amplo espaço para o futebol
de areia e um iate clube para guarda e conserto de barcos de lazer ou dos
praticantes do remo – o esporte de maior evidência no Rio, até a década de 1920.
A boa fama da praia de Ramos durou até o final da
década de 1940, quando a construção da Avenida Brasil – com o aterramento de
parte da Baía de Guanabara – e a inauguração da ponte de acesso à Ilha do
Governador (1949) – a pedido da Aeronáutica, que já possuía bases de
combustíveis na ilha –, provocaram grandes alterações, com sérios prejuízos
para a qualidade do meio ambiente e do lazer na região.
Em meados dos anos de 1960, o governo do Estado
tentou revitalizar a área, com a retirada de moradias construídas de forma
desordenada, a construção de um calçadão e melhor iluminação pública.
Degradação
ambiental – Mas,
em pouco tempo, o lugar novamente se deteriorou, pela falta de investimentos, o
abandono do poder público, a volta das ocupações irregulares – dando origem,
inclusive, ao Complexo da Maré –, bem como os ininterruptos despejos de
resíduos poluentes nas águas da Baía de Guanabara.
Em 1981, o balneário já apresentava o maior índice
de poluição entre as praias da cidade, segundo a Fundação Estadual de
Engenharia do Meio Ambiente (FEEMA, atual Inea). A praia recebe, até hoje, o
esgoto dos canais do Cunha, do Fundão e da Penha.
Durante décadas, a degradação ambiental pouco incomodou
o poder público. Até que, em abril de 2000, a sociedade civil recorreu à
Comissão de Defesa do Meio Ambiente da Assembleia Legislativa do Estado do Rio
de Janeiro (Alerj) para promover um abraço simbólico à praia e reivindicar
melhorias socioambientais.
Parque
ambiental – Diante
da manifestação pública, o então governador do Estado, Anthony Garotinho,
anunciou um conjunto de obras na localidade, com a criação do Parque Ambiental
da Praia de Ramos Carlos Roberto de Oliveira (Dicró), mais conhecido como “Piscinão
de Ramos”.
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Foto: Olho Verde/Moscatelli
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Inaugurado em dezembro de 2001, ao custo de R$ 3
milhões, o parque consiste num lago artificial de 26mil m², revestido com uma
camada de polietileno e capacidade para 30 milhões de litros de água.
O Parque Ambiental da Praia de Ramos não foi construído
para se tornar uma área de proteção ambiental (APA) – cujo objetivo é preservar
a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar o uso
dos recursos naturais. A finalidade principal do parque era oferecer uma área
de lazer para substituir a praia de Ramos, imprópria ao banho, além de valorizar
os imóveis da região e atrair pessoas de outros Estados.
O projeto original apresentava equipamentos para a
prática desportiva, quiosques para o comércio de alimentos e bebidas, praças,
brinquedoteca e lona cultural. O maior
atrativo, porém, era a piscina pública de água salgada – o “piscinão” –, que chegou
a receber 60 mil pessoas nos fins de semana de verão. Atualmente, a frequência
está reduzida à metade. À exceção da piscina, os demais equipamentos de lazer
estão abandonados.
Problemas
locais – Pouco
tempo após a inauguração, dois problemas se destacaram na área do “piscinão”. O
primeiro foi a falta de segurança pública, que já existia antes mesmo do
parque, localizado em região dominada por facções criminosas rivais.
O segundo problema é higiênico. O parque nasceu
limpo e logo apresentou altos índices de contaminação na água e na areia. Isso
ocorreu, principalmente, pela falta de educação dos frequentadores, que se
mostraram indiferentes aos cuidados necessários à preservação do local e suas
instalações – por exemplo, não urinar ou defecar na água da piscina artificial
e impedir a presença de animais nas areias.
Apesar da garantia da Fundação Instituto das Águas
do Município do Rio (Rio Águas) de que o tratamento da água da piscina ocorre
diariamente e de que o lago está próprio para banho, a simples observação
visual indica o contrário. Lodo e lixo dominam o local e a água tem a coloração
escura, “barrenta”.
Opiniões
divergentes – Morador
do bairro da Penha, José, 66 anos, foi assíduo frequentador da praia de Ramos
desde a infância. Em sua opinião, é a Baía de Guanabara, e não somente a praia,
que precisa de limpeza.
“O que se encontra são bichos mortos e lixo”,
atesta. Preocupado com o estado de degradação da água, que “pode originar
doenças de pele e respiratórias”, José gostaria de frequentar novamente a
praia, “se fosse limpa”.
Alheios a este cenário, milhares de banhistas – a
maioria, originária de camadas socioeconômicas menos favorecidas – parecem não
se importar com a sujeira evidente e continuam a lotar o lugar durante o verão.
É o caso de Mariana, 47 anos, que mora perto do
“piscinão”. Apesar da poluição e do receio de contrair doenças e micoses, ela
continua usufruindo dessa opção de lazer. Admite, porém, que “na década de 80
era melhor”.
Mas, entre aqueles que frequentam o local desde sua
criação, há quem prefira evitar o contato com a água do lago salgado. Romeu, 28
anos, é uma dessas pessoas. Embora também resida na área do “piscinão” e
frequente socialmente o local, o rapaz nunca utilizou tomou banho na praia de
Ramos. “Ela não possui o tratamento adequado. Se fosse limpa, eu utilizaria”,
diz.
Sem
compromisso – Em
janeiro de 2015, a questão da limpeza do local motivou o site de notícias UOL a
procurar a Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb) e a organização sem
fins lucrativos ONG Ecos (Espaço, Cidadania e Oportunidades Sociais),
contratada para gerir os espaços esportivos da praia. Ambas se isentaram de qualquer
responsabilidade sobre a decadência e más condições de higiene do “piscinão”.
Na avaliação dos integrantes do Verdant, o estado atual daquele parque
ambiental reflete a forma como a preservação ambiental ainda é encarada em
nosso país. Apesar da construção de um parque com excelente estrutura de lazer,
não houve um projeto efetivo de educação da população sobre o uso e a proteção
do espaço utilizado – uma iniciativa que, ao longo do tempo, iria contribuir
para a própria despoluição das águas da Baía de Guanabara.
O processo de despoluição tão almejado passa,
necessariamente, pelo compromisso global com as condições ambientais da baía.
Enquanto essa consciência não for priorizada por governantes e habitantes do
Rio de Janeiro, teremos promessas e nenhuma ação.
Sobre o desenvolvimento do bairro
de Ramos
Conforme pesquisa realizada no SESC de Ramos, no
início do século XX, um caixeiro-viajante da fabrica de tecidos Andorinhas,
chamado João José Batista, fez fortuna e impulsionou a urbanização do bairro.
O empreendedor residia numa mansão onde hoje está
localizado o prédio do SESC de Ramos. Ele foi responsável por diversas construções
no bairro e todas traziam, na fachada, a figura de duas andorinhas esculpidas
em gesso.
Bibliografia: